A Máscara Ibérica
CIMI em Lazarim
2018
Fotografia: Lurdes Pereira
Diabos,
caretos e senhorinhas,
singularidades
do Entrudo mais típico do Douro
Texto: Lurdes
Pereira
Fotos: Lurdes
Pereira
Já se adivinha,
pela aragem do tempo, a azáfama das festas profanas de origem medieval. Nesta
quadra, o calendário anuncia o cartaz da brincadeira, da farra, da folia, da
pândega num período que precede a quaresma, o Entrudo muito apelidado, entre
nós, por Carnaval.
Por todo o
lado se brinca ao carnaval, se promovem desfiles e se dinamizam as terras ao
gosto local.
Lazarim, freguesia
de Lamego, podia ser mais uma entre muitas vilas de Portugal, mas há uma
tradição que não só a retira do anonimato como a transforma numa das vilas mais
singulares graças tradição a que está associada. Lazarim é um epicentro de
tradição secular.
Faça sol,
nevoeiro, vento, frio ou chuva, a população sai à rua metamorfoseada de novas
identidades, de máscaras de madeira artesanais, de fatos de palha, peles de
animais. A vila transforma-se num palco de ar livre onde todas as peripécias,
aliadas à tradição, adensam o espírito carnavalesco numa desordem total.
Quem vem ao
carnaval de Lazarim, vem admirar tradições, e para quem visita a vila fora
desta quadra, o Centro Interpretativo da Máscara Ibérica (CIMI) tornou-se
paragem obrigatória para, neste núcleo mais recatado, ter a oportunidade de
fazer uma interpretação de toda a história do entrudo Lazariense/Ibérico. Uma joia
guardiã e testemunha das tradições carnavalescas mais genuínas de Portugal.
Este Centro surge com o objectivo de investigação e referência Europeia no
estudo e valorização do património cultural, que tem como temática a máscara. Criaram,
através da criação do CIMI, um elo de ligação entre a história e a arte, entre
a memória e a valorização entre a tradição e a continuidade.
Tendo como
temática “A Máscara”, no seu interior podem-se observar belos exemplares vindos
um pouco de toda a Península Ibérica.
As máscaras de
Lazarim, esculpidas em madeira de amieiro, são um atrativo e provocam admiração
nos olhares do público. São um excesso de originalidade onde a naturalidade da
cor marca a diferença entre as demais com fisionomias de criaturas tão originais
quanto estranhas. Os caretos resumem a sua essência numa magnífica obra de arte
saída dos formões e navalhas de artesãos, que nem por isso escondem a sua
originalidade e inspiração tão satírica quanto cómica. Não é por acaso que
estes engenhos, esculpidos para oferecer uma nova identidade a quem a enverga,
sejam tão cobiçados por colecionadores e público em geral.
O ponto alto
do evento é caracterizado pelos caretos num cortejo etnográfico e pela leitura
dos testamentos protagonizados por dois grupos rivais de raparigas e rapazes nos
quais espelham as vivências clandestinas daquela época confrontada com as
autoridades institucional e religiosa vigentes. As raparigas têm como missão
ler o “testamento da burra” aos rapazes que lhes respondem com o “testamento do
burro”. Têm como suporte o uso de palavrões, cujo sarcástico, jucoso e vernáculo
serve para classificar a linguagem das quadras rimadas, numa espécie de guerra
entre os sexos opostos. Trata-se de um género de batalha ou de um cantar ao
desafio ou festival de má-língua num ritual pagão que terá sido aproveitado
para uma regeneração espiritual da comunidade onde o burro e a burra serve de
paralelismo para acentuar a metáfora de vertente sexual.
Se não é fã da
confusão, pode visitar o carnaval e apreciar de perto a máscara ibérica num
ambiente mais calmo, num lugar onde residentes, estudiosos e académicos se
sentem atraídos e, muitos deles repetentes ao Carnaval dos diabos, demónios,
caretos e das senhorinhas, no Entrudo mais típico do Douro.