terça-feira, 3 de julho de 2018

Olhares da Serra - Bolota

26 de Maio de 2018 - Caminhada solidária




Aromas da “bolota” na terra fresca


Texto e fotos
Lurdes Pereira













































































Foi no passado 26 de Maio que Associação De Valorização E Desenvolvimento Rural Do Vale Do Cabrum fez a diferença em Terras de Montemuro - Uma caminhada solidária com as receitas a reverter a favor do projecto de reflorestação do Vale do Cabrum. O percurso circular de 8 km, estudado pela Associação, teve recepção em Covelinhas, lugar onde terminou a caminhada, depois de todos os inscritos se deliciarem com as maravilhas das paisagens serranas deste concelho.




Decorria o Verão de 2017 quando já se previa a devastação da grande mancha verde. O pulmão de Resende tornou-se inóspito, e por isso, este movimento jovem pôs mãos à obra. Enquanto tratavam burocracias já se manifestavam nos trabalhos de campo. 


A Associação manifesta o descontentamento e preocupação à desertificação e aos incêndios que nos últimos anos têm fustigado violentamente as florestas que coroam estes vales no mapa do concelho. Ainda no mesmo ano conseguiram mover a sensibilidade de alguns populares na recolha da bolota negreira com finalidade da criação de um viveiro. Mas porquê a bolota? Entre muitas outras espécies, o Carvalho Pardo das Beiras, Carvalho-Pardo-do-Minho e Carvalho-Negral são vegetações autóctones de maior densidade nestas encostas. 


Em Novembro do mesmo ano, cavamos terreno, enchemos vasos, semeamos bolotas…cerca de 7000 bolotas. As expectativas superaram este dia cheio de aventura, cujo fruto nos pode levar a sonhar: “imagina verde!”. Em menor quantidade foram também semeadas nogueiras e castanheiros, entre algumas espécies arbusteiras que já teimam em rasgar a terra.


Os rigores do Inverno passaram, e depois de uma prospecção de terreno e com caminhos públicos antigos limpos, chegou a hora de uma caminhada solidária para crianças e crescidos, porque “a natureza agradece o teu apoio”.


Estavam todos lá. Covelinhas fez-se sala de acolhimento tendo como anfitriã, a bolota, representada por estes jovens para receber os amigos desta causa há muito agendada e pensada ao pormenor. Por trás da bancada, a T-shirt e o boné ocupavam lugar de destaque tendo como pano de fundo a Igreja de Covelinhas, “arcanjo” das sementeiras da “bolota”.


E como fora prometido pela organização, estavam lá a oferecer, a todos os caminheiros, bonés, t-shirts, mochila e uma garrafa de água. O palco vestiu as cores da Primavera e a associação assumiu uma identidade do “Verde” sempre com a estampa da bolota a acompanhar. Pensaram em todos os pormenores, só era necessário levar a boa disposição, saúde e sorrisos de amizade.


De um ponto mais elevado, Tiago Colaço dá as boas vindas juntamente com a inauguração do percurso. A subir, logo um belo espigueiro de nobre beleza paisagística de outros tempos a triunfar lá no alto. 


O percurso é denso de história das gentes que aqui passaram. As paisagens são estonteantes e os pormenores sublimes. Aqui um lavadouro com uma pedra rampeada onde muitas mulheres lavaram a roupa suada do campo, ali uma e outra casinha sem nada, abandonada reservando no silêncio da diáspora a sua história. Estes pequenos monumentos vestem vestidos encaudados em eiras soalheiras onde outrora, provavelmente se ouviam cantigas populares. Parece que aldeias inteiras sofreram abandono. As pedras e as telhas, adornadas com o musgo do Inverno, soltam olhares tristes encobertos pelo orvalho da manhã. E nas pontes, a água parece que fala o estalar com as pedras. No entanto, há quem persista viver agarrados ao sonho e às memórias do passado, onde só um pouco da civilização conseguiu chegar.


Os caminhos estreitinhos registam nas pedras a memória da vida dura, tão dura para os homens como para os animais que puxavam os carros por aqueles quelhos tão íngremes e escavacados. Caminhos onde também as mulheres desfilaram com as suas longas saias, e de rodilha na cabeça equilibravam os molhos de lenha miúda recolhida nos montes. Na passagem, sente-se o aroma da erva fresca acabada de calcar e os tapetes floridos exalam perfumes tipicamente agrestes e doces da Primavera tardia.


O projecto em fase de iniciação, contudo, a Associação pretende “Defender e valorizar o ambiente e o património natural (…) com ações de sensibilização e reflorestação” e, entre outros objectivos, “Reavivar, revitalizar e manter tradições e práticas culturais instituindo-se assim traços de identidade cultural”. Porque, seja pela obra da natureza ou pela obra do homem, o Vale do Cabrum é um museu vivo que todos podem contemplar.


Faço uma vénia a esta Associação que luta pela causa maior - respirar e deliciar os “olhares da serra” no vale do Cabrum, o vale encantado e implantado na Serra de Montemuro.